Composta por um Destacamento de Suprimento e Manutenção, quatro Esquadrões Aéreos (1°/9°GAv, 7°ETA, 7°/8°GAv e 1°/4°GAv) e um Batalhão de Infantaria Especial (BINFAE-MN), a Base Aérea de Manaus (BAMN) forma atualmente um dos mais importantes complexos de Unidades Aéreas da Força Aérea Brasileira (FAB), localizada na cidade de Manaus (AM). Em sua área, encontram-se ainda um Esquadrão de Helicóptero do Exército Brasileiro, um simulador utilizado para o treinamento de tripulações que operam a aeronave C-105 Amazonas e um Hospital Militar. Somado a esse contexto, desfruta também de um terminal de passageiros – parte integrante do antigo Aeroporto Internacional de Manaus – e de sítios arqueológicos encontrados na década de 1960 e mapeados pelo Museu Amazônico (HILBERT, 1968 apud LIMA, 2002).
Base Aérea de Manaus
Com esta composição, a Base Aérea de Manaus, atualmente, ostenta um dos passados mais curiosos no que se relaciona ao seu surgimento e sua efetivação. Em sua arquitetura atual pouco ou quase nada é destacado das antigas instalações que, ainda em madeira, antecederam sua consolidação em 1970. Porém, quais os fatores que contribuíram para a sua idealização e a partir de qual Instante esse contexto se encetou? Diante dessa conjuntura, a pesquisa em destaque conduziu-se tomando como ponto de partida a Segunda Guerra Mundial.
Com a produção gomífera que ascendia na Ásia, fruto do trânsito ilegal de sementes da borracha silvestre que se transportou para a Inglaterra e suas colônias, a Amazônia passou a desfrutar de um dos períodos mais letárgicos para o comércio que conduzia a base econômica da região. Com o avanço japonês durante o conflito mundial e a consequente tomada dos vales de produção gomífera na Malásia, Bornéu e outras regiões (no início de 1942), os Aliados (representados pelos norte-americanos) viram-se impelidos a recorrer à região sul-americana para atender as suas necessidades de matéria-prima (MARTINELLO, 1988). Ainda segundo Martinello (1988) esta aproximação reforçou a relevância do Brasil frente às exigências que acabaram o conduzindo aos interesses em questão: o fornecimento de borracha à indústria bélica Aliada.
Iniciada em 2009, véspera do quadragésimo aniversário de inauguração da Base Aérea de Manaus e tendo em vista o preenchimento de vazios existentes na história da referida organização, a pesquisa transcorreu por aproximadamente três anos e foi marcada por diferentes etapas, as quais se caracterizaram por visitas a organizações militares, institutos, acervos e bibliotecas, buscando assim a apreciação de dados e a acareação de informações.
Conduzindo-se para o período entre 1940 e meados da década de 1950, a pesquisa amparou-se na ponderação de diferentes fontes (primárias e secundárias), as quais revelaram pontos importantes e significativos na política de aproximação dos americanos para com os países sul-americanos.
Buscou-se entender os diferentes aspectos que os conduziram a essa postura, tendo em vista a infraestrutura implantada e a consequente abertura do campo de pouso da Base Aérea de Manaus, fator este que acabou mostrando-se primordial à estabilização da Força Aérea Brasileira na Amazônia Ocidental e ainda na edificação do primeiro aeroporto de Manaus.
BASE AÉREA EM CONSTRUÇÃO | 1979 |
Com base na elucidação de um passado pouco explorado pela historiografia militar, o presente artigo buscou apresentar um estudo minucioso da região de Ponta Pelada, local onde se encontram o antigo aeroporto internacional e a Base Aérea de Manaus. Visando a coerência e a precisão nas informações apresentadas, tomando como marco inicial a presença americana em Manaus. Porém, para uma avaliação aprofundada e tendo como meta o esclarecimento dos diferentes aspectos epistemológicos que envolveram o tema, a pesquisa conduziu-se para uma avaliação bibliográfica e de análise de fontes, caracterizando-se assim o processo de fundamentação do levantamento historiográfico necessário.
Na avaliação bibliográfica, apesar de tratar-se de um assunto específico, destacaram-se nomes como os de José de Carvalho, Francisco César Ferraz, Vagner Camilo Alves, Pedro Martinello, Samuel Benchimol, José Jefferson Carpinteiro Peres, Luiz de Miranda Corrêa e Mário Ypiranga Monteiro, autores estes que forneceram contribuições importantes para nosso empreendimento historiográfico.
Para a análise do cor pus documental, foram empreendidos esforços diversos voltados para a avaliação dos mais diferentes jornais. Nesta questão destacaram-se as leituras de diferentes periódicos (Jornal do Comércio, O Estado do Amazonas, O Jornal e A Tarde), todos editados na cidade de Manaus e ainda a interpretação das diferentes legislações que nortearam o passado em estudo e também de diferentes fontes disponibilizadas pela Base Aérea de Manaus e pelo Primeiro Esquadrão do Nono Grupo de Aviação (1°/9°GAv). Os tabloides catalogados foram de vital valor, pois, através dos mesmos, identificou-se o período de inauguração das instalações do primeiro aeroporto internacional em Manaus e a abertura da primeira pista de pouso localizada no bairro de Flores (informação acareada com o livro de Mário Ypiranga Monteiro).
Na busca por fontes fidedignas, várias visitas foram empreendidas à Biblioteca Mario Ypiranga Monteiro, à Biblioteca Pública do Amazonas, à Biblioteca Municipal João Bosco Pantoja Evangelista e à Biblioteca Arthur Reis. Também transcorreram buscas no Centro de Documentação e Histórico da Aeronáutica (CENDOC), no Museu Amazônico, no Arquivo Público de Manaus e no Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA).
Visando à compreensão do envolvimento brasileiro no conflito mundial e da diplomacia empregada, a pesquisa utilizou-se dos livros de Vagner Camilo Alves e Francisco César Ferraz. Para a avaliação da presença americana em Manaus e da receptividade manauara frente aos avanços assistidos, foi importante o livro de José Jefferson Carpinteiro Peres. A pesquisa utilizou-se também do discurso de Samuel Benchimol, obra que destacou pontos importantes sobre a exploração da borracha silvestre durante a década de 1940 e o aparato empregado no escoamento da mesma.
Mais adiante, para a compreensão dos progressos da Força Aérea Brasileira (FAB) no pós-guerra, o trabalho consultou a obra de José de Carvalho. Este, entre outras contribuições, focou sua atenção no cenário técnico-operacional da FAB e destacou a criação de diferentes organizações da Força Aérea Brasileira.
1 A FORÇA AÉREA NACIONAL NO CONTEXTO DA SEGUNDA GUERRA
Com a invasão da Polônia pelos nazistas, a Segunda Guerra Mundial colocou as sociedades perante um novo cenário econômico, bélico e ideológico (ALVES, 2002). O Velho Mundo entrava em um de seus piores instantes, um verdadeiro cenário de caos, forçando as nações antinazifascistas a assumirem uma postura defensiva. Os Estados Unidos, após o ataque de Pearl Harbor, em 7 de dezembro de 1941, declarou guerra ao Eixo (Alemanha, Itália e Japão), consequentemente empregando um projeto de reaparelhamento e modernização de suas Forças Armadas e empregando também uma nova política externa para com as nações vizinhas (FERRAZ, 2005).
Entre outros fatores, deram início à construção de pistas de pouso ao longo do continente americano através de uma política de aproximação (MARTINELLO, 1988). Além da corrida estratégica na qual se buscava a autorização para implantação de bases militares, procurou-se ainda o fornecimento de matérias-primas para o abastecimento da indústria bélica, isso devido à abundância de recursos agrícolas, produtos extrativistas vegetais e minerais que transpareciam nos territórios adjacentes (FERRAZ, 2005).
Não obstante, nos anos seguintes, após uma sequência de afundamentos que aniquilariam inúmeros navios e vidas, e ainda sob forte pressão social, o governo brasileiro afastou-se definitivamente do caráter ideológico defendido pela Alemanha (ALVES, 2002).
Ainda sobre esse envolvimento, Alves destaca que, entre:
[...] fevereiro e março (1942), cinco navios brasileiros foram afundados (Cabedelo, Buarque, Olinda, Arabutã e Cairu), todos ao longo da costa atlântica dos Estados Unidos. Entre maio e junho, sete navios foram perdidos (Parnaíba, Gonçalves Dias, Alegrete, Pedrinhas, Tamandaré, Piave e Barbacena), todos afundados no Caribe ou mares imediatamente adjacentes [...] Em agosto foram destruídos os primeiros navios nacionais no litoral do País (Baependi, Araraquara, Aníbal Benevolo, Itagiba, Arará e a barcaça Jacira), causa imediata para declaração de guerra brasileira à Alemanha e Itália. Após a formalização de sua beligerância, o Brasil ainda perderia mais doze navios até fins de 1943 (Osório, Lages, Antonico, Porto Alegre, Apalóide, Brasilóide, Afonso Pena, Tutóia, Pelotaslóide, Bagé, Itapagé e Campos). Destes, somente dois foram perdidos longe dos mares litorâneos brasileiros. (ALVES, 2002, p. 169-170).
Como destacado, em quase dois anos o Brasil teve uma perda de pouco mais de duas dezenas de navios, afundados por submarinos alemães. Desta forma, oficializou o seu envolvimento no conflito com a declaração de guerra e a concordância com a política externa americana. Quanto ao último ponto, é importante lembrar que, mesmo antes de um abandono definitivo das relações com os alemães, já se observava, segundo Alves (2002, p. 170), que “os portos de Salvador e Recife” estavam à inteira disposição da Quarta Frota dos Estados Unidos, sendo Recife o ponto principal da esquadra Americana.
Paralelo ao contexto que transcorria na Europa, no Brasil, as autoridades militares, antes mesmo do envolvimento direto no conflito, arquitetaram a proposta de uma nova força armada. Em 1941 foi realizada a fusão das aviações do Exército e da Marinha. Em um primeiro momento, essa nova instituição militar passou a se chamar Forças Aéreas Nacionais e, posteriormente, foi denominada Força Aérea Brasileira (CARVALHO, 2004). Contudo, as autoridades brasileiras viram-se forçadas à instauração de estruturas capazes de atender a esta nova aviação que se moldava.
Mirando os anseios da Força Aérea Brasileira e as necessidades desta nova força, no ano de sua concepção, a capital amazonense recebeu o Técnico Francisco Oliveira, do Departamento de Aeronáutica Civil, e que no dia 31 de março de 1941 foi recebido pelo Interventor Álvaro Maia no Palácio Rio Negro (sede do governo). Sua viagem, coordenada pelo então Ministério da Aeronáutica, teve em vista a fiscalização e
o acompanhamento da construção de uma pista de pouso.
Como exposto pelo tabloide A Tarde (O FUTURO..., 1941), seguindo as orientações do então Ministério da Aeronáutica, era necessária uma região que possibilitasse futuras modernizações e ampliações e que fosse capaz de atender à aviação e aos encargos que norteavam este
setor. Em um primeiro momento, os terrenos de Ponta Pelada não foram aceitos e, diante desse parecer, a obra direcionou-se para a região de Flores, sendo iniciada em 2 de abril de 1941.
2 ESFORÇO DE GUERRA
Aeroporto de Ponta Pelada (cartão postal)
Com a tomada das áreas de produção de borracha asiática conquistadas pelos japoneses (reservas que totalizavam 97% da necessidade da indústria bélica Aliada), manobras foram empregadas direcionando a diplomacia americana para o território brasileiro (CORRÊA, 1967). Como resultado dessa aproximação americana, Corrêa (1967) destaca que convênios foram fechados, entre ambas as Nações, em 3 de março de 1942, e estas, por sua vez, resultaram no envio de matéria-prima para a indústria bélica Aliada e na concessão de apoio estratégico no território brasileiro; em troca, o Brasil recebeu um projeto siderúrgico e a modernização de suas forças armadas, entre outros progressos. Segundo Martinello (1988), nesse mesmo período, e tendo em vista a carência de borracha, nos Estados Unidos foi proibida a venda de pneumáticos e, ainda, assinado um decreto que racionava a borracha em todo o território americano.
De um momento para o outro, a Amazônia se viu “envolvida no conflito mundial em função do retorno forçado do monopólio da borracha silvestre” (BENCHIMOL, 1992, p. 71). Segundo Benchimol (1992), os americanos colocaram em prática um planejamento ousado, no qual se fizeram necessárias estruturas capazes de atender às necessidades de busca e escoamento da borracha.
Atendendo ao esforço de guerra, o Brasil assistiu, em seu território, à construção de áreas as quais se destinaram especificamente às operações aéreas e de auxílio ao escoamento de borracha. É interessante observar que, segundo Alves (2002), um decreto presidencial, de junho de 1941, antes mesmo da assinatura dos acordos firmados em 3 de março de 1942, já autorizava a construção de aeroportos e bases aéreas por empresas americanas.
Apesar de um decreto oficializar atividades americanas em território brasileiro, esta atuação, como se viu em relação à Amazônia, só ocorreu a partir de 1943, com a abertura da pista de pouso de Ponta Pelada.
Ponta Pelada não foi escolhida por acaso: sua localização, próxima à margem (esquerda) do rio Negro, facilitava o transporte rápido e eficiente da produção gomífera que, vinda de barco dos seringais, chegava a Manaus e, logo em seguida, era transportada para Miami, no território americano (CORRÊA, 1967).
Somado à necessidade do momento, o Decreto nº 1.020, de 07 de maio de 1943 (MANAUS, 1943?), reafirmou a importância do esforço de guerra. Utilizando-se de argumentos que justificassem a implantação de uma nova pista de pouso na cidade de Manaus, o interventor amazonense ratificou a necessidade de um novo espaço para as aeronaves que percorreriam as rotas nacionais e internacionais.
Como demonstra o texto da lei:
O Interventor Federal no Estado do Amazonas, usando das atribuições que lhe confere o art. 181da constituição brasileira, combinada com a alínea I do art. 7º do Decreto-lei Federal nº 1.202, de 08 de abril de 1939 e tendo em vista o que dispõe o art.5º, letras “e” e “n” e art. 6º do Decreto-lei nacional nº 3.365, de 21 de junho de 1941 e, considerando que a necessidade da construção de um campo de pouso para aeronaves, que percorram rotas nacionais e internacionais, se impõe ao Governo do Estado, como medida inadiável e de alto alcance administrativo; considerando, que em se tratando de melhoramentos dessa natureza, que visem proporcionar a criação e a disseminação de centros de população e o funcionamento de outros meios de transporte coletivo, “tudo deve ser sacrificado no interesse do Estado”.
Art. 1º - Ficam declaradas de utilidade pública as terras de domínio do Estado, situadas entre a cidade de Manaus e a Vila do Paredão, à margem esquerda do rio Negro, abrangendo uma área de 1.577 hectares, com perímetro de 16.329,80 metros lineares, compreendidos na demarcação efetuada pela diretoria dos serviços técnicos, limitando-se ao Norte e a Oeste com terras desocupadas; ao Sul com a margem esquerda do Rio Negro e a Leste com Igarapé do Picanço, tudo de acordo com a planta anexa ao respectivo processo. (MANAUS, 1943?).
Não deixando de reconhecer a importância desta medida para a região, a lei citada estabeleceu em seu artigo 1° que as terras supracitadas seriam destinadas à construção de um aeródromo, inserindo-se em uma área de 1.577 hectares. A construção da pista de Ponta Pelada consolidou e somou-se às inúmeras medidas que perfaziam as necessidades dos acordos firmados entre ambas as nações, necessidades estas as quais buscavam especificamente executar o escoamento da borracha de forma rápida.
Para a construção desta pista de pouso de Ponta Pelada, os americanos trouxeram as máquinas, o auxílio técnico e financeiro. Devido à situação atípica com que os Aliados se depararam, a pista de Ponta Pelada ficou pronta em semanas (BENCHIMOL, 1992). Ainda sobre as estruturas do aeroporto de Ponta Pelada, o Rubber Development Corporation (RDC), responsável por sua construção, solicitou ao governo brasileiro que, além das áreas delimitadas para a abertura da pista de pouso e construção do aeroporto, o governo teria que fornecer madeira e todos os tipos de matérias-primas para as
edificações que seriam erguidas.
Consequentemente, o órgão ficaria isento de impostos e qualquer outro tipo de taxa; em troca, ao final do contrato, os bens imóveis seriam entregues ao governo brasileiro (CORRÊA,1967). No local, para cumprir a finalidade a que se destinava (fornecer o apoio à aviação), instalou-se uma central meteorológica e de comunicação. Somou-se também ao projeto a construção de casas, um terminal de passageiros e armazéns. Um ponto interessante a se observar nesse contexto diz respeito ao grande número de visitantes que passaram a frequentar a área de Ponta Pelada, devido à rotina atípica que transcorria naquele que transcorria naquele local (PERES, 1984).
3 RUBBER DEVELOPMENT CORPORATION
Tendo como meta a aquisição e o transporte da hevea amazônica, os americanos criaram um órgão capaz de executar as mais diferentes manobras para que se suprissem as necessidades da indústria bélica. Num orbe de carências, constituiu-se o Rubber Development Corporation, a qual, de 1° de abril de 1942 a 30 de junho de 1946, assumiu todo o programa de aquisição e escoamento da borracha silvestre (CORRÊA, 1967).
Devido às exigências, suas ações destacaram-se pela construção de inúmeras “pontes de atracação para os aviões anfíbios” que operavam na região, entre outras estruturas. Corrêa (1967, p. 110) mostra também que tal mobilização mostrava-se de “valor incalculável na obtenção de borracha” no menor espaço de tempo possível. No Brasil, o RDC manteve um escritório no Rio de Janeiro (RJ), um em Manaus (AM) e outro em Belém (PA).
No escritório de Belém, Martinello (1988) destaca que, embora a capital paraense desfrutasse de uma melhor organização das atividades relacionadas à atuação do órgão, o grande número de funcionários acabou dificultando o planejamento das mesmas devido à falta de instalações adequadas para acomodar todo o pessoal, somado ainda à precariedade no sistema de transporte presente em Belém. Já em Manaus, a realidade não era muito diferente: em decorrência das limitações estruturais, com poucas habitações apropriadas, os funcionários do RDC tiveram que se acomodar nos camarins do Teatro Amazonas (BENCHIMOL, 1992).
A ausência de acomodações em Manaus tomou tal vulto que foi proposta a construção de um prédio na região de Ponta Pelada e ainda uma Vila Americana para abrigar todos os funcionários do órgão; entretanto, o projeto não foi executado (MARTINELLO,1988). Esse escritório em Manaus ficou responsável pelo “abastecimento, navegação, navegação aérea, contratação de técnicos e construção de casas, estradas, armazéns, pistas de pouso” (CORRÊA, 1967, p. 85-86). O escritório do Rio de Janeiro assumiu as atribuições de aquisição de todo o alimento que seria fornecido aos trabalhadores que seguiam para a Amazônia para a extração da borracha.
Sobre os encargos que envolviam o órgão, Ferraz (2002) comenta que, além das atividades ligadas à construção, o RDC também coordenou as reformas e equipagem das áreas destinadas às operações aéreas.
Quanto ao transporte aéreo, Pedro Martinello (1988) explica que devido à frota do Serviço de Navegação e Administração do Porto do Pará (SNAPP), em 1942, representar um terço da frota que operava na Amazônia em 1910, fez-se necessário o emprego de ações que demonstrassem resultados rápidos para a chegada da matéria-prima em seu destino final, a indústria bélica Aliada; no entanto, Benchimol (1992, p. 73) utiliza outra teoria na qual tenta explicar tal ação pela “urgência e o bloqueio marítimo da costa brasileira”. Seja pela deficiência ou não nesse sistema de transporte disponível, todos estes pontos expuseram detalhes plausíveis, pois os diferentes aspectos estavam em evidência no período em questão.
A Amazônia estava mergulhada em um período de estagnação, devido ao distanciamento dos compradores da borracha amazônica, consequentemente, não dispunha de um aparato capaz de atender à demanda que se projetava; por outro lado, era reconhecidamente perceptível a preocupação com o transporte marítimo, isto tendo em vista as ações alemãs no Atlântico e a quantidade de afundamentos ao longo deste oceano.
Em relação às aeronaves empregadas, Benchimol (1992) afirma terem sido utilizadas as aeronaves Catalina e S-42; no entanto, Corrêa (1967) destaca que vários contratos foram fechados para que se realizasse este tipo de transporte; entre eles, destacou-se o convênio com a empresa Pan American Airways. O RDC também fechou acordo com a Panair do Brasil, facilitando os deslocamentos entre Manaus, Belém, Tabatinga, Porto Velho, Guajará-Mirim e Iquitos (Peru); firmou, ainda, contrato com a Loide Aéreo Boliviano, a Companhia de Aviation Faucett S.A. (do Peru) e com a Avianca (empresa colombiana).
Conforme já citado, entre os acordos consolidados foi estabelecido também que a Panair do Brasil assumiria as rotas de transporte comercial do território brasileiro, ocasionando consequentemente o afastamento definitivo das empresas alemãs e italianas do espaço aéreo brasileiro e, assim, direcionando todas as obrigações de construção, reformas e operações dos aeroportos brasileiros para os
americanos (ALVES, 2002).
DESASTRE DO PP-PDE – 50 ANOS (5º dia)
Sem jornal no dia anterior, na terça-feira, 18 de dezembro, Manaus ficou sabendo da situação do avião sinistrado e dos passageiros e tripulantes. Em reportagem intitulada – Mata do Rio Preto guarda destroços do “Constellation”, o matutino dos Archer Pinto descreve as últimas notícias.
Primeiro, informa que, no dia anterior, um avião Hercules do governo americano trouxe dois helicópteros da Base Aérea de Cumbica (SP) para Manaus. Essas aeronaves, pilotadas pelos tenentes Henrique e Valdir (lamento que haja somente os nomes de guerra), chegaram ao local do acidente na tarde de ontem, aproximando-se a altura de 25m, acima da vegetação. Portanto, em condições de esclarecer o mais importante, se havia sobreviventes.
Nota publicada em O Jornal, 18 dezembro 1962
Segundo, confirmado o acidente e reconhecido o PP-PDE, os helicópteros passaram a orientar a expedição que partiu da rodovia Manaus-Itacoatiara, nas proximidades do Km 63, de um acampamento da Pavinorte, construtora desta estrada. Devido as condições do terreno, esperavam os expedicionários alcançar a clareira aberta pela aeronave em cinco dias. Mais uma vez é preciso esclarecer que toda a área era de selva, sem estrada vicinal ou acidente fluvial que permitisse reduzir esse prazo.
Nesse dia, o Governo do Estado, em conjunto com autoridades da FAB e da Panair do Brasil, publicaram a seguinte Nota Oficial:
O Governo do Estado, o Serviço de Buscas e Salvamento e a Panair do Brasil, informam que: após o sobrevoo, por dois helicópteros da AB, do local assinalado como do acidente do PP-PDE, constatou-se positivamente o encontro dos destroços do aparelho sinistrado na madrugada do dia 14 próximo passado.
Os helicópteros pilotados por oficiais da FAB, transportaram o comandante Luciano e engenheiro Loral, ambos da Panair, que ao regressarem do voo foram positivos no reconhecimento daquela aeronave sinistrada.
Lamentavelmente, não existe (sic) indícios de sobreviventes no local do sinistro. (...)
Tal expedição que deixou o km 63 hoje, às primeiras horas da manhã, será orientada no seu percurso por aviões e helicópteros da FAB baseado naquele acampamento.
Manaus, 17 de dezembro de 1962
Pelo Governo do Estado – Dr. Cláudio Palhas;
Pela Panair – comandante Girão Marques de Oliveira e Dr. Loral;
Pela FAB – major aviador Guilherme Cal.
5. BASE AÉREA DE MANAUS
Idealizada a partir da pista de pouso de Ponta Pelada e tendo como referência as experiências que a antecederam, como o Comando dos Pelotões de Fronteira (criado em 1946), o Destacamento de Base Aérea de Manaus (efetivado em 1954), o Destacamento de Aeronáutica de Manaus (iniciado em 1955) e ainda o Grupamento de Aeronáutica de Manaus (instituído em 1968), a BAMN iniciou suas atividades em 31 de março de 1970.
Base Aérea de Manaus em construção, 1979
Nessa data o periódico O Jornal publicou em sua primeira página a manchete: “Aeronáutica inaugura Base Aérea...” (PRESENÇA... 1970, p. 1). Na matéria foi informado o empenho do governo na busca pelo desenvolvimento da região Norte. O mesmo jornal destacou a importância da presença militar para a região e o reconhecimento pelo trabalho desenvolvido pelas Forças Armadas, e dizia que:
Efetiva e de valor inestimável, tem sido a participação das Forças Armadas – Exército, Marinha e Aeronáutica – na integração de toda a Amazônia [...] Registra-se com patriotismo e satisfação, para todos os brasileiros em geral e os amazônidas em particular, o trabalho que as Forças Armadas desenvolveram em favor do nosso progresso, do bem estar e desenvolvimento de toda área. É a Amazônia esquecida que desponta para a realidade sua integração ao resto do Brasil. (PRESENÇA... 1970, p. 1).
Reconhecendo as necessidades da região, a Base Aérea de Manaus, Figura 4, iniciou suas atividades com aproximadamente 20% de sua capacidade estrutural atual, isto é, com edificações que se resumiram a um refeitório, dois prédios para a acomodação de graduados e oficiais e um hangar, este último voltado exclusivamente às atividades aéreas em um cotidiano técnico/operacional da nova organização militar e, especificamente, voltada às aeronaves C-115 Buffalo (adquiridas, no final da década de 1960, da empresa De Havilland of Canadá).
O início de suas atividades aéreas, conforme o livro histórico do 1°/9°GAv (1970), começou em 3 de julho de 1970 e teve como propósito integrar a região Norte, fornecendo apoio às Unidades de fronteira do Exército Brasileiro e da Marinha de Guerra, provendo apoio ao Instituto de Pesquisa da Amazônia (INPA), às situações de calamidades públicas e também às missões de misericórdias, entre outras atribuições.
Depois do Destacamento de Base Aérea de Manaus (inaugurado em 1954), o 1º/9ºGAv, instalado na Base Aérea de Manaus, tornou-se a segunda Unidade aérea da Força Aérea Brasileira a operar na Amazônia a partir de Manaus. Porém, antes de sua efetivação na capital amazonense, mais especificamente na região de Ponta Pelada, sua primeira subordinação de comando, conforme boletim interno n° 67, da Base Aérea de Belém, de 11 de abril de 1969, foi exercida em Belém (PA), sob a direção do Major Aviador Raimundo Alves de Campos.
Ainda locado na 1° Zona Aérea (capital paraense), o esquadrão foi denominado Núcleo de Primeiro do Nono, onde permaneceu até 17 de abril de 1970. Logo em seguida foi transferido com todo o seu efetivo e equipamentos para as instalações recém-inauguradas na Base Aérea de Manaus, dando início às suas atividades sob o comando do Major Aviador Camilo Ferraz de Barros.
Seja pela efetivação do aeroporto internacional ou pela intensificação da presença da aviação militar, essas ações mostraram-se de valor inestimável no quesito socioeconômico e estratégico. Com a incorporação e aprimoramento de um espaço capaz de atender à aviação comercial e militar, os negócios, tendo em vista as atividades do polo industrial, se intensificaram com a abertura do Aeroporto de Ponta Pelada. Paralelamente, conforme livro histórico do 1°/9°GAv (1970), com a renovação das atividades militares, a Amazônia passou
a desfrutar da garantia de envio de ajuda às populações mais carentes e apoio aos órgãos governamentais vigentes na região.
CONCLUSÃO
Tendo como meta mostrar o contexto historiográfico que envolve a região de Ponta Pelada, em Manaus, o presente artigo direcionou-se para uma avaliação da repercussão da passagem americana por esta área, durante a Segunda Guerra Mundial, e da pista de pouso aberta em 1943. Para definir este momento, quatro pontos foram avaliados: a não admissão da área de Ponta Pelada (como espaço destinado à
aviação) em 1941 pelo técnico Francisco Oliveira, do Departamento de Aeronáutica Civil; o direcionamento da primeira pista de pouso de Manaus para o bairro de Flores (aberta em 1941); os acordos firmados entre Brasil e Estados Unidos em 3 de março de 1942, por meio dos quais, após o ataque de Pearl Harbor (7 de dezembro de 1941) e a tomada dos seringais na Ásia (início de 1942), conduziram a diplomacia americana para a Amazônia brasileira em busca da borracha natural, consequentemente forçando a edificação de uma estrutura capaz de auxiliar no escoamento desta matéria-prima e; por fim, a assinatura do decreto n° 1.020, de 7 de maio de 1943, o qual declarou a área de Ponta Pelada de utilidade pública e oficializou a construção de um aeródromo.
O trabalho observou que, na região em análise, diferentes contextos se seguiram após a desmobilização americana. Deste exame destacou-se que, entre 1954 e 1976, a área de Ponta Pelada esteve voltada às atividades do primeiro aeroporto de Manaus, sendo substituído apenas em 26 de março de 1976, após a inauguração do Aeroporto Internacional Eduardo Gomes.
Por outro lado, a mesma região contou ainda com a forte e atuante presença da Força Aérea Brasileira, que iniciou suas atividades já na década de 1940. Sobre este aspecto, a região de Ponta Pelada, como já sinalizado no contexto, revelou significativo crescimento após a Segunda Guerra Mundial, evolução esta que contribuiu de diferentes formas para a aviação militar.
Nessa conjuntura, destacou-se o Comando dos Pelotões de Fronteira, efetivado em 1946, e o Destacamento de Base Aérea de Manaus, inaugurado em 20 de janeiro de 1954.
Os levantamentos indicaram ainda o Destacamento de Aeronáutica de Manaus, efetivado em 1955, e o Grupamento de Aeronáutica de Manaus, idealizado em 1968; logo em seguida substituído pela Base Aérea de Manaus, inaugurada em 31 de março de 1970. Tendo em vista a historiografia militar e os estudos ligados à Amazônia, a presente pesquisa espera ter estimulado novos trabalhos que possam explorar a
conjuntura que envolve o contexto ligado à Força Aérea Brasileira e as lacunas que possam ter sido evidenciadas neste trabalho.
Este estudo espera ainda ter despertado o interesse para futuros trabalhos que venham a contribuir no entendimento das operações aéreas que se realizavam, a partir de Manaus, nas décadas posteriores à desmobilização americana, e das estruturas logísticas que foram empregadas pela FAB, tendo em vista a distância dos grandes centros e as limitações operacionais.
Diante disso, o trabalho em questão encerrasse esperando ter contribuído de forma plausível na identificação das etapas e dos mecanismos que auxiliaram no escoamento da borracha silvestre, a partir da região de Ponta Pelada, e seus resultados para o contexto militar e socioeconômico regional.
Fonte: BLOG DO CORONEL ROBERTO
Nenhum comentário:
Postar um comentário