Inicialmente será preciso advertir que o primeiro gesto de admiração do índio por gente vestida diferentemente deles, que só usavam tangas e aracoiaba (saiote de penas) acontece com o contato entre eles e o capitão Francisco Orellana em 1541. A partir, portanto, da colonização portuguesa no século seguinte (XVI), é que se inicia uma reviravolta nos costumes, com as famílias colocadas em terras das Capitanias do Cabo do Norte e do Grão Pará. Só conhecemos os tipos de roupas femininas ou por xilogravuras imperfeitas ou pelos tipos de fazenda que a coroa portuguesa mandava distribuir aos colonos, os quais alegavam que suas mulheres e filhas não podiam ir à igreja por não terem “roupas de ver a Deus”. Que tipos de fazendas eram aquelas? Os documentos escritos nos dizem, na sua linguagem indecisa: peças ou côvados de “bertanha” (Bretanha), algodão não curado, chitas lisas, meias grosseiras, nada de sapatos nem de chinelos, somente socos. Para compensar essa míngua de ofertas, o governo autorizava a entrega de novelos de algodão cru, rocas de fiar e um ou outro tear de pedal. Os grandes teares só aparecem na Capitania de São José do Rio Negro, na vigência do governo Lobo de Almada, quando este mandou construir a Fábrica. Fechada esta, a população viu-se a braços com o problema duplo de importar as peças de Belém ou de fiar em casa o pano de algodão. Este último recurso foi o que deu certo e como se vê na foto do século XVIII, em todas as residências haviam fiandeiras, ou contratadas e/ou escravas.
A roca era um aparelho muito simples, constando de uma armação de madeira, dotada de roda grande que era movida a pedal e um rolo na parte superior para enrolar o fio de algodão. Trabalhava-se naquilo o dia inteiro ou em horas de lazer e obtinha-se o material necessário para o tear. Este sim, requeria maior desempenho e cabeça, pois a tecedeira deveria seguir certos padrões convencionais e a partir deles, elaborar seus desenhos próprios, com fios coloridos ou não. O tear não foi introduzido pelo colono, o indígena já o conhecia, pois fazia suas redes de fio de tucum, de trama bem apertada. Existem gravuras em livros de viajantes.
O governo português mais tarde já concedia equipamentos para os colonos, e mesmo chegava a dotar as filhas de família com um arsenal de roupas sofisticadas, daquele modelo que ia transitando do afogado para o amplo. Não dava presentes caros, do tipo jóias, sapatos, adereços feminis. Também as leis suntuárias proibiam que as escravas usassem ouro e brilhantes, sedas e veludos. Daí a grande sortida de colares e pulseiras de contas, aqueles “berenguendens” de que falam os cronistas e que continuam a encantar a mulher, enfeites feitos de sementes de mulungu, de lágrima de Nossa Senhora, com pendentes talhados em caroço de tucumã, e anéis do mesmo, chamados “memória”.
Os primeiros modelos de toalete feminina de que se ocupa a história, sem notícia detalhada, são oriundos do século XVI e foram as saias balão. A partir de um conjunto básico, que constituía a “braga” (calça frouxa apresilhada no tornozelo), anágua, camisa inteira, parapeitos, então sobrevinha a cobertura do colo, com uma blusa. Algumas damas de colo exuberante usavam o corselete e outras o espartilho. Esta peça era tirânica, pois tendia a acochar as banhas, diminuindo o “à vontade” dos movimentos, além de que eram feitas com talas de aço. Depois foram substituídas por barbatanas de baleia. A mulher desse período não usava sapatos de entrada baixa. Ou eram botinas de tacão baixo ou servilhas. As mestiças e escravas usavam o mesmo modelo, mas de pano diferente, algodão. No século dezoito as saias passaram a chamar-se “baroneza”, “veneziana”, ou “saias balão”, por causa do amplo diâmetro da fímbria que arrastava no chão. Quanto à blusa era de decote atrevido, mostrando o nascimento dos seios. O interessante é que para as mulheres mostrar os mocotós era mais ofensa ao pudor que mostrar os seios à Maria Antonieta. Para as mulheres de baixo nível social essa toalete chamava-se “descalça”, porque a mulher não usava calçados nem mesmo servilhas. Em compensação não deixava de trazer uma flor no cabelo, sua garridice. Madame Agassis ilustrou seu livro com o retrato de uma mestiça nesses trajes, mas não se refere ao nome “descalça”. Também nesse período a mulher da Amazônia não usava chapéu. Os cabelos eram armados ou em “torre” (enrolados para cima) ou em coque (popularmente cocó, enrolados na nuca). Atrás da cabeça elas metiam o “trepa moleque”, um pente grande, ornamentado, que ajudava a suspender a mantilha. O penteado podia variar daí para os cachos, os bandós, as tranças enroladas, os xixís. Cabelos soltos e tranças livres só as portuguesas usavam.
O fim do século XIX trouxe Paris para a Amazônia e a indumentária mudou, com o uso e o abuso de grandes chapéus, vestidos de cauda, de uma só peça ou de duas, luvas e mitemes, calças curtas pelos joelhos, sapatos de entrada baixa e salto alto (ou botinas), sutiãs pré-fabricados, mas o uso do espartilho de barbatanas continuou até à década de vinte, mais ou menos, quando ela se libertou das calças (passando a usar calcinhas) e dos espartilhos. Os grandes “abanicos” ou leques eram fabricados no Japão e na Espanha, e certamente tiveram grande influência social nesse período. Os cosméticos é que não faziam parte do seu arsenal de boudoir. Os cheiros e os tônicos eram de origem natural: óleo de mutamba para o cabelo ficar ondulado e negro; patchuli, cumaru, para a roupa. Com a invasão da Europa, os perfumes do tipo kananga do Japão passaram a substituir o regional.
Gostaria de saber a fonte bibliográfica do Texto.
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